Conforme recente entendimento do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, não se caracteriza inadimplemento contratual quando a inexecução da obrigação ocorreu por fatores alheios ao controle da parte.
Trata-se de ação movida pela Construtora ABCDW 2000 Empreendimento Imobiliário contra a Fundação Getúlio Vargas (“FGV”). No caso, as partes firmaram negócio em 2000, com a finalidade de construção de um Centro Empresarial projetado por Oscar Niemeyer. Ocorre que, em meados de 2009, a FGV rescindiu o contrato argumentando que a Construtora ABCDW 2000 havia inadimplido suas obrigações ao não iniciar as obras no prazo acordado, em que pese não existisse qualquer objeção perante a Administração Pública que as impedisse.
De se destacar, contudo, que foi constatada pendência de licenciamento junto ao Poder Público, e que isso seria de responsabilidade da FGV.
Dessa forma, eventual inexecução contratual, pela ABCDW 2000, antecedida pela ausência de licenças junto ao Poder Público, de responsabilidade da FGV, não teria o condão de ensejar inadimplemento contratual pela ABCDW. Ambas as partes tinham conhecimento dessas restrições, e o dever de cooperação é imprescindível. Dessa forma, a opção pelo rompimento da relação contratual requerida pela FGV caracterizaria violação à boa-fé objetiva.
Nesse sentido, a Construtora ABCDW 2000 sustentou que empenhou todos os esforços que estavam ao seu alcance para viabilizar a construção do empreendimento, mas que, apesar disso, foi surpreendida em 14/03/2002 com liminar em ação ajuizada pelo Ministério Público sobrestando o curso das obras. Ademais, salientou que a FGV deveria entregar o terreno regularizado, o que não aconteceu.
A Magistrada do caso consignou em sua decisão que o contrato entre as partes previa hipóteses de condições suspensivas, entre elas, a obtenção de licenças de obras e que, portanto, enquanto a construção não fosse efetivamente autorizada, a Construtora ABCDW 2000 não poderia ser acusada de descumprimento de suas obrigações, e que a FGV tinha plena ciência de tais condições.
Ademais, a FGV teria violado a regra do artigo 422 do Código Civil, que estabelece às partes obrigação de observância dos princípios de probidade e boa-fé. Vez que havia impedimento ao início das obras que extrapolava o controle da ABCDW 2000 e era de responsabilidade da FGV, e isso não poderia ser atribuído à ABCDW 2000 como motivo à rescisão contratual.
Os deveres anexos ou de proteção basilares da probidade e boa-fé objetiva devem ser observados pelas partes durante toda a relação contratual, em qualquer fase. Partindo dessa premissa, a Magistrada ratificou a responsabilidade da FGV, por violação positiva do contrato ante a inobservância da boa-fé objetiva, e entendeu restar comprovado que as obras não se iniciaram por exigências restritivas não atendidas em relação às quais a FGV tinha pleno conhecimento. Nessa linha, a FGV foi condenada ao pagamento em perdas e danos (danos emergentes e lucros cessantes) à Construtora ABCDW.
Fonte: Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro – TJ/RJ Processo: 0001988-05.2010.8.19.0001
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